O Tribunal Superior do Trabalho (TST) concedeu, pela primeira vez, estabilidade a uma trabalhadora que ficou grávida por inseminação artificial durante o período de aviso prévio indenizado. A decisão foi proferida por unanimidade pela Subseção I da Seção Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) – responsável por consolidar a jurisprudência trabalhista.
O entendimento, segundo afirmou ao Valor o relator do caso, ministro Alexandre Agra Belmonte, deverá servir de precedente para outros casos semelhantes. “O fato de ter havido inseminação artificial não retira o direito à estabilidade durante a gravidez, ainda que a discussão sobre o método tenha ficado a latere [de lado]”, diz.
A estabilidade nesses casos deve prevalecer, de acordo com o ministro, para se preservar o direito à vida. “Este é o momento em que a mãe e o bebê mais precisam de um convívio harmônico e de tranquilidade.”
O caso analisado pelos ministros envolve uma ex-gerente comercial do Serviço Especializado de Nutrição Parenteral e Enteral (Senpe), em Manaus. A funcionária trabalhou na função de fevereiro 2007 a outubro de 2010. E, de acordo com o laudo técnico do processo, teria ficado grávida 18 dias após a demissão.
A funcionária foi dispensada no dia 18 de outubro de 2010 sem ter que cumprir os 30 dias de aviso prévio. No processo, ela afirmou que a empresa sabia que estava fazendo tratamento para engravidar em São Paulo e que foi demitida grávida. O Senpe, por sua vez, alegou que os exames demissionários atestam que a ex-gerente não estava grávida no momento da demissão.
No laudo técnico, ficou comprovado que em 2 de novembro de 2010 foram realizadas as coletas de óvulos e espermatozoides e a fertilização in vitro. E que no dia 5 foi feita a implantação dos embriões.
Para o Tribunal Regional do Trabalho da 11ª Região (AM e RR), o laudo provaria que a trabalhadora não estava grávida durante a demissão e, portanto, não teria direito à estabilidade.
Porém, ao analisar o caso, a 7ª Turma do TST reformou a decisão e restabeleceu a sentença de primeiro grau com base no artigo 489 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). O dispositivo prevê que a rescisão só ocorre efetivamente depois de expirado o prazo do aviso prévio. A questão foi levada então à SDI-1, que manteve o entendimento.
Os ministros da 7ª Turma ainda relembraram que a Orientação Jurisprudencial (OJ) nº 82 da SDI-1 estabelece que “a data de saída a ser anotada na CTPS [Carteira de Trabalho e Previdência Social ] deve corresponder a do término do prazo do aviso prévio, ainda que indenizado”. Com isso, a turma determinou o pagamento dos 14 salários a que a gerente teria direito pelo período de estabilidade e seus reflexos – nove meses da gestação e os cinco meses posteriores ao nascimento do bebê.
Segundo o ministro Alexandre Agra Belmonte, não interessa se a empresa tinha conhecimento ou não da inseminação artificial. “O fato é objetivo. Se a funcionária estava grávida durante o aviso prévio, tem direito à estabilidade.”
A advogada da funcionária, Elisângela Nogueira Rodrigues, afirma que fez uma busca na jurisprudência do TST e não localizou julgados semelhantes. “No caso, a empresa tinha conhecimento sobre o seu tratamento para engravidar e a demitiu grávida, já que teve conhecimento da sua condição durante o aviso prévio e chegou até a comunicar o RH da empresa sobre sua gravidez”, diz.
De acordo com a advogada Williane Gomes Pontes Ibiapina, sócia do setor trabalhista do Siqueira Castro Advogados, a estabilidade teria sido concedida apenas pelo fato de a gravidez ter sido confirmada durante o aviso prévio indenizado. “O TST ainda deverá se aprofundar mais, em outros processos, sobre a questão da inseminação artificial, mas acredito que sempre prevalecerá o direito de preservação da vida, caso seja averiguada a boa-fé da mãe”, afirma.
Procurado pelo Valor Econômico, o advogado do Senpe no processo, João Antônio da Silva Tolentino, não deu retorno até o fechamento da edição.