Diante da autonomia garantida pela Constituição Federal para a instituição de tributos pelos estados e municípios, a escolha por delegar ao legislador complementar nacional a elaboração de uma lista taxativa de serviços tributáveis por ISS é válida. É admissível, também, a técnica legislativa usada ao permitir que a interpretação desses itens seja extensiva ou ampliativa.
Com esse entendimento, o Plenário virtual do Supremo Tribunal Federal julgou o tema 296 da repercussão geral, em sessão encerrada à meia-noite de sexta-feira (29/6). O placar foi formado por maioria, prevalecendo o entendimento da relatora, ministra Rosa Weber.
A tese aprovada foi: “É taxativa a lista de serviços sujeitos ao ISS a que se refere o art. 156, III, da Constituição Federal, admitindo-se, contudo, a incidência do tributo sobre as atividades inerentes aos serviços elencados em lei em razão da interpretação extensiva”.
Definição da controvérsia
O caso analisou a lista de serviços em que incide ISS a partir do disposto no artigo 156, inciso III da Constituição. A norma não define quais são esses serviços. Apenas decide que essa lista será feita por lei complementar — portanto de abrangência nacional —, que incluirá quaisquer serviços para serem cobrados pelo município, desde que não listados no artigo 152, que estabelece a competência tributária estadual.
“Embora a lei complementar não tenha plena liberdade de qualificar como serviço tudo aquilo que queira, a jurisprudência admite que ela o faça em relação a certas atividades econômicas que não se enquadram diretamente em outra categoria jurídica tributável”, explicou a ministra Rosa Weber.
Amplitude de interpretação que o STF deu à tese pode abrir "perigosa válvula de escape", segundo o ministro Gilmar Mendes
Para a relatora, há validade constitucional também no fato de essa lista ser determinada de forma que permita uma interpretação extensiva. Ela é validada quando o legislador, por exemplo, inclui termos como “de qualquer natureza”, “de qualquer espécie” e “entre outros” ao definir os serviços tributários.
“Não vislumbro a existência de obstáculo constitucional contra essa técnica legislativa. Excessos interpretativos, seja da parte do Fisco, seja do contribuinte, sempre poderão ocorrer, mas o acesso ao Poder
Judiciário para solucionar as eventuais controvérsias é resposta institucional para a resolução dessas”, afirmou a ministra.
Assim, cabe interpretação extensiva “sobre as atividades inerentes aos serviços elencados em lei”, segundo a tese proposta e aprovada por maioria. A própria lei complementar em questão — LC 116/2003 — assim admite em seu parágrafo 4º do artigo 1º: a incidência do imposto não depende da denominação dada ao serviço prestado.
Divergência Seis ministros seguiram a relatora: Alexandre de Moraes, Luiz Edson Fachin, Carmen Lúcia, Roberto Barroso, Luiz Fux e Dias Toffoli. Abriu divergência o ministro Gilmar Mendes, especificamente quanto à extensão em que caberia a “interpretação extensiva” citada na tese proposta pela relatora.
Para ele, tal interpretação caberia apenas nos casos em que especificamente o legislador se utilizou da técnica citada pela relatora, incluindo expressões mais abrangentes. Caso contrário, o rol deixa de ser taxativo. Principalmente na interpretação de operações mistas (prestação de serviços e de fornecimento de mercadorias).
“Permitir o contrário seria abrir perigosa válvula de escape àquela regra da taxatividade, produzindo gritante insegurança jurídica, ao se repassar aos Entes municipais a possibilidade de interpretar determinada atividade como extensivamente inserida no rol taxativo de serviços e, consequentemente, tributada por ISS, em uma miríade de infindáveis discussões”, disse o ministro Gilmar Mendes.
Segunda divergência
O entendimento do ministro Gilmar Mendes foi seguido pelos ministros Celso de Mello e Ricardo Lewandowski. A segunda divergência, mais restritiva, é do ministro Marco Aurélio, para quem o rol de serviços é taxativo, e o disposto na lei complementar que regula a matéria não admite interpretação extensiva.
“Caso contrário, dá-se carta branca ao legislador ordinário para, a partir de conceitos imprecisos contidos no anexo do Decreto-Lei nº 406/1968 e, posteriormente, na Lei Complementar nº 116 /2003, englobar todo e qualquer negócio jurídico como passível de ser tributado pelos Municípios”, apontou. RE 784439
Fonte: STF