Descontos em academias de ginástica, óticas, cirurgias de estética e até em cursos de idiomas são algumas das vantagens que as empresas privadas de planos de saúde na Argentina oferecem para cobrar um pouco mais pela mensalidade e tentar aumentar a rentabilidade. O mercado argentino é para poucos atores, com altos custos e grande competitividade.
Em vigor desde o início deste ano, a lei dos planos privados de saúde obriga as empresas a oferecer uma cobertura mínima que inclui tratamento de doenças pré-existentes, proíbe cobranças diferenciadas por faixa etária e impede o estabelecimento de carências. Todos os planos preveem descontos em medicamentos de até 70% e cobrem odontologia básica.
Está quase tudo coberto e o aumento de custos limita a competição em preço. A saída é cobrar por adicionais que podem interessar a quem tem maior poder aquisitivo, comentou o presidente da Associação das Empresas de Medicina Privada (Ademp), Nestor Gallardo.
O sistema de saúde argentino é misto, como o brasileiro, mas a saúde pública não é universal: a rede pública está aberta para procedimentos de alta complexidade, aposentados e cidadãos que não estejam no mercado de trabalho formal, o que inclui cerca de 38% da população de 46 milhões de habitantes.
A saúde da maior parte dos argentinos está à cargo dos sindicatos, que controlam as obras sociais. Cada grande sindicato cria a sua própria rede de assistência, com muitos hospitais próprios e médicos credenciados. É um universo pulverizado, com 250 entidades. A maior delas, a dos comerciários, conta com 1 milhão de afiliados. Atendem a 51% da população.
Os planos de saúde privada ficam com os 11% restantes, ou 5 milhões de clientes, divididos igualmente entre planos corporativos e individuais. O primeiro segmento é o que mais cresce, com a redução do desemprego na Argentina nos últimos anos, e nessa fatia o poder de fogo está com o usuário.
A lei determina que o empregado pague 30% da prestação e dá a ele o direito de escolher qual o plano que o seu empregador irá pagar , comenta Gallardo. Como a obra social sempre será mais barata que o plano privado, as empresas do setor procuram se diferenciar pela cobertura ainda mais abrangente, disse a especialista Daniela Khole, da empresa de consultoria na área de saúde Key Market.
De acordo com Daniela, a baixa rentabilidade provocou um movimento de concentração entre as empresas privadas. As cinco maiores (OSDE, Swiss Medical, Galeno, Omint e Medicus) controlam 75% do mercado. As dez maiores ficam com 90% do total. É estratégico para as empresas verticalizarem o sistema. Apenas uma grande operadora, a OSDE, não conta com hospitais próprios. Isto torna a concentração um fenômeno natural, disse.
As empresas de capital estrangeiro foram absorvidas pelas grandes competidoras nacionais. A última a se retirar foi a Consolidar, que era controlada pela espanhola BBV e foi absorvida pela Omint. A brasileira Amil chegou a atuar no país, mas saiu em 2000. Este mercado altamente regulado pelo governo e com margem estreita nunca atraiu os investidores externos, comentou.
No último ano, além da nova regulamentação, outro fator que fechou a porta para o capital de fora foi o ambiente de restrição cambial que a Argentina passou a viver desde outubro. A remessa de lucros e dividendos para o exterior passou a ser severamente limitada. E o controle de preços pode afetar o funcionamento do sistema. Nesta segunda-feira, hospitais e clínicas particulares deixarão de atender clientes do setor privado em todo o país, em um protesto contra o reajuste de 7% na remuneração paga pelos planos, percentual baixo diante da inflação. Este percentual é exatamente o que foi autorizado pelo secretário de Comércio Interior, Guillermo Moreno, para as prestações dos planos ao consumidor final. Os planos pretendiam aplicar um reajuste de 15% nas mensalidades e de 12% para os prestadores de serviço.
Segundo Daniela Khole, o setor privado de planos de saúde fatura cerca de US$ 4,5 bilhões no país. O crescimento médio real anual tem sido de 5%, já descontada a inflação estimada da ordem de 25% ao ano. A expansão tem se dado pelo aumento do número de clientes, que vão paulatinamente migrando das obras sociais, afirmou.
Fonte: Valor Econômico