Associação de transplantes de órgãos admite alterar peça publicitária que simulou recall de córneas após reclamação de conselho de oftalmologia
A Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos (ABTO) promete alterar uma campanha publicitária de incentivo à doação que simula um “recall” de córneas de pessoas nascidas entre 1988 e 2010. Publicado ontem em jornal de grande circulação nacional, o anúncio é alvo de críticas do Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO).
Produzido pela agência Leo Burnett Tailor Made, a peça publicitária traz o título “Comunicado Urgente de Recall aos proprietários de córneas” e simula a convocação para a substituição do órgão, sob alegação de que correria o risco de desenvolver uma doença chamada ceratocone – enfermidade grave e real que, como explica o texto, pode até levar à cegueira.
“Constatada a necessidade de substituição da córnea, os serviços serão realizados em, aproximadamente, 7 dias úteis”, diz a peça. Apenas na parte de baixo, em letras pequenas, a brincadeira fica mais clara, com a mensagem: “Não é tão simples assim substituir um órgão doente.”
Mesmo sem uma reclamação formal da entidade de oftalmologia, a ABTO admite fazer alterações na peça. “Realmente constatamos que os elementos podem confundir um pouco leitor. Fizemos uma analogia com a indústria automobilística para incentivar a doação de órgãos”, explicou o presidente da ABTO, José Osmar Medina Pestana. “A intenção era mostrar que substituir um órgão não é o mesmo que trocar peças de um carro.”
O dirigente garante, no entanto, que a entidade não recebeu nenhuma reclamação por parte dos leitores.
Para Paulo Augusto de Arruda Melo, membro do CBO e da câmara técnica de doação de órgãos do Ministério da Saúde, o efeito pode ser contrário ao desejado. “Esse anúncio mais afasta que traz doadores. Traz uma imagem negativa e dá a impressão de que o transplante pode dar errado”, afirma o oftalmologista.
Segundo ele, a brincadeira não fica óbvia para o público em geral. “Claro que nunca se viu recall na área de saúde e muito menos é utilizado o termo ‘proprietário’ para um paciente. Mas, mesmo assim, é uma forma estranha de anúncio, porque confunde elementos reais”, diz Arruda Melo. “Imagine o susto em pessoas nesta faixa etária que tenham passado por transplante de córnea, por exemplo.”
Redes sociais. No início do mês, declarar-se como doador de órgãos passou a ser uma opção para os usuários de redes sociais. Em parceria com o Facebook, o Ministério da Saúde criou um serviço que permite que os usuários do site de relacionamentos manifestem o desejo de ser doador e convidem seus contatos a fazerem o mesmo.
A informação pode ser adicionada à linha do tempo e agregada ao perfil de cada usuário. Ao contrário dos EUA, onde a manifestação ampliou o número de doadores, a declaração não tem valor legal no Brasil, pois a doação no País só é permitida com o aval dos parentes da pessoa falecida.
Fonte: O Estado de S. Paulo