Cada vez menos leitos disponíveis à população

De 2005 até junho deste ano, o país perdeu 47 mil vagas de internação em hospitais. Segundo ministério, a redução, devido a avanços tecnológicos no setor, é tendência ...

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De 2005 até junho deste ano, o país perdeu 47 mil vagas de internação em hospitais. Segundo ministério, a redução, devido a avanços tecnológicos no setor, é tendência mundial. Especialistas, porém, ressaltam o prejuízo da ausência, principalmente, nos pronto-socorros

Os hospitais públicos brasileiros perderam cerca de 47 mil leitos de outubro de 2005 até junho deste ano. Nesse período, as vagas caíram de 374.707 para 327.636. Levantamento do Conselho Federal de Medicina, com base nos dados do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES/MS) e da Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB), mostrou que essa redução ocorreu em áreas como pediatria, obstetrícia e psiquiatria – devido à reforma implementada na área em 2001. Se computados os dados de 1990 a 2011, o número de leitos inativos passa de 200 mil. Apesar de o Ministério da Saúde informar que a desativação de leitos é uma tendência mundial por conta dos avanços tecnológicos que permitem tratar o paciente sem a necessidade de internação, especialistas criticam a postura da pasta.

Segundo o levantamento, o maior problema das Unidades de Tratamento Intensivo (UTIs), por exemplo, é a má distribuição. Mais de 70% das 25 mil vagas que o país têm no setor estão concentradas nas regiões Sul e Sudeste. Uma das vítimas do problema foi a mãe da dona de casa Maria da Penha Ferreira Gomes, 55 anos, moradora de Ceilândia. “Tive que recorrer à Justiça para conseguir uma vaga. Mesmo com a liminar, foi difícil e tarde demais. Minha mãe estava internada no Hospital da Ceilândia e foi transferida para a UTI com morte cerebral. Ficou uma semana e morreu. Se ela tivesse sido transferida antes, poderia estar viva”, conta Maria da Penha.

No Distrito Federal, porém, a Secretaria de Saúde informa que o número de UTIs tem aumentado e está dentro da meta definida pelo Ministério da Saúde – três leitos para cada 10 mil habitantes. Atualmente, a rede conta com 343 vagas, 137 a mais que no ano passado. O ministério também destaca que expandiu a capacidade nesse setor. A meta para este ano é criar quase 1,8 mil vagas, 37% a mais do que habilitado em 2011.

Carência

Para a professora de saúde pública da Universidade de Brasília (UnB) Helena Shimizu, a questão dos leitos no país é preocupante. Os que foram desativados, segundo ela, fazem falta, principalmente em áreas como pediatria e obstetrícia. “O Índice de Desempenho do SUS (IDSUS) mostra que existe uma carência muito grande de hospitais. É claro que é importante investir no desenvolvimento da atenção primária, da saúde da família, mas é preciso avançar em laboratórios especializados e hospitais”, recomenda. As diferenças regionais também preocupam a professora, que destaca a discrepância dos estados do Norte e do Nordeste, por exemplo.

O presidente do Conselho Federal de Medicina, Roberto D’Ávila, diz que a crise está localizada nas unidades de pronto-socorro. “Os hospitais estão com as emergências superlotadas. Têm pacientes internados que poderiam estar apenas em observação. É preciso decidir se interna ou manda para casa”, lamenta. Segundo ele, esses que são internados, como não têm leitos, ficam pelos corredores. Para D’Ávila, falta uma rede ambulatorial adequada e recursos para melhorar a infraestrutura, o que leva médicos e sanitaristas a desistirem do serviço público de saúde.

O Ministério da Saúde frisa que tem investido em novos projetos, como a implementação das Unidades de Pronto Atendimento 24h (UPAs), o programa Melhor em Casa, com atendimento domiciliar, e a capacitação dos profissionais que atuam nas equipes de Saúde da Família. Na obstetrícia, apesar de existirem leitos desativados, o ministério lembra que, só este ano, a área ganhou reforço de 350 vagas. A pasta informa que o SUS tem 353.751 leitos no setor, segundo consulta do último dia 6 ao CNES. Pesquisa realizada pela reportagem no mesmo banco de dados no último dia 7 mostrou 327.492.

Reinserção
A Reforma Psiquiátrica Brasileira começou a ser discutida na década de 1970. A ideia é promover a redução de leitos de longa permanência e incentivar as internações psiquiátricas apenas quando necessárias. Os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) são peça-chave nessa reforma. De acordo com o Ministério da Saúde, o objetivo é oferecer atendimento à população, realizar o acompanhamento clínico e a reinserção social dos usuários pelo acesso ao trabalho, lazer, exercício dos direitos civis e fortalecimento dos laços familiares e comunitários. A pasta frisa ainda que esses serviços devem ser substitutivos e não complementares ao hospital psiquiátrico.

Reforma em ritmo lento
Na psiquiatria, a reforma ocorrida em 2001 é a razão da queda do número de leitos. Segundo especialistas, a mudança apresentou um pensamento mais moderno na área da saúde mental, mas, por estar sendo implantada a passos lentos, retirou do sistema vagas que seriam úteis, principalmente, por causa da epidemia das drogas. Titular da Promotoria de Justiça de Defesa da Saúde do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios, Jairo Bisol lembra que o modelo anterior era perverso por explorar a institucionalização do paciente. “A implementação do novo modelo, entretanto, não avança”, critica.

Segundo ele, a reforma é um avanço não só do ponto de vista clínico, como ético. “Mas falta investimentos em novas tecnologias e equipamentos. O número de Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) e enfermarias especializadas está aquém da demanda e, evidentemente, a ferramenta da internação é indispensável. Não pode ser uma lógica, mas é uma ferramenta”, esclarece.

O psiquiatra Juberty Antônio de Souza acredita que a redução das vagas deixou o país sem assistência. “Existe uma série de situações em que a primeira medida é a internação. Uma pessoa com um surto psicótico tem dificuldade hoje em conseguir uma internação”, diz. Para ele, há um equívoco na forma como a superação do sistema está sendo arquitetada. “A assistência primária não tem dado resultado e isso termina sobrecarregando os equipamentos hospitalares.”

Levantamento do Conselho Federal de Medicina mostra que, de 2005 até este ano, a quantidade de leitos psiquiátricos caiu de 45.336 para 36.039 – variação de 21%. Dados do Ministério da Saúde indicam que existem 1.831 CAPS em funcionamento. A previsão é instalar 13,5 mil vagas distribuídas entre CAPS, enfermarias especializadas em hospitais gerais e em unidades de acolhimento transitório.

Fonte: Correio Braziliense

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