O Pílulas teve acesso com exclusividade a um documento em que o Ministério da Saúde expõe as dificuldades que a Coordenação-Geral do Programa Nacional de Imunizações (CGPNI) tem enfrentado para garantir a manutenção dos estoques de seis tipos de vacinas e principalmente dos soros anti-peçonhentos no País.
O setor, segundo um informe emitido pela pasta no dia 25 de fevereiro, “não tem conseguido atender a demanda de distribuição de alguns imunobiológicos com regularidade”. Algumas das situações têm previsão de regularização ainda em abril, outras apenas em maio ou junho.
Em algumas das vacinas, o estoque estratégico do País foi comprometido. Um estoque estratégico é uma espécie de reserva de segurança e deve ser suficiente para abastecer a demanda por um período de 3 a 6 meses, conforme informou o secretário de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde Jarbas Barbosa, em entrevista exclusiva ao Pílulas.
A entrega das vacinas é feita pelo Ministério da Saúde às secretarias estaduais de saúde, que repassam os lotes aos municípios.
São Paulo
No caso da BCG, que protege contra tuberculose, o reflexo das dificuldades aparece nos postos de saúde. Na capital paulista, por exemplo, todos os sete postos consultados pelo blog informaram que estão fazendo uma espécie de racionamento há cerca de um mês e meio: a vacina é oferecida em um único dia da semana. Com isso, a ideia é aproveitar melhor as várias doses de um mesmo frasco que, uma vez aberto, precisa ser descartado após 6 horas.
A Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo confirmou, por meio de nota, que “há desabastecimento momentâneo em algumas unidades de saúde” da vacina BCG. Ainda segundo a pasta, a “a administração dessas vacinas está sendo agendada semanalmente para otimizar a utilização das doses do frasco”.
O Ministério afirmou na sexta-feira, dia 4 de abril, que não há motivos para racionamento e que a situação já deveria estar normalizada nos postos. O Pílulas apurou, contudo, que entre junho do ano passado e fevereiro deste ano houve um déficit de mais de 1 milhão de doses de BCG só para o Estado de São Paulo. Em outubro e novembro de 2013 e em janeiro de 2014, por exemplo, nenhuma vacina foi entregue ao Estado, cuja demanda mensal é de cerca de 250 mil doses. Em fevereiro foram entregues 210.500 doses e, no fim de março, cerca de 300 mil doses.
Médicos ouvidos pelo blog lembraram que o País deve receber uma quantidade grande de estrangeiros nos próximos meses para a Copa do Mundo e há, neste momento, surtos em outros países de algumas doenças que podem ser evitadas com vacinas – caso do sarampo, na Europa e na África.
Por meio de nota ao blog, o Ministério da Saúde afirmou que, “para assegurar o abastecimento contínuo das vacinas, encaminha, rotineiramente, informes às secretarias estaduais de saúde sobre as medidas que garantam a oferta dos produtos, otimizem o uso das vacinas e reduzam possíveis desperdícios. Essas orientações ajudam a evitar problemas pontuais que podem ocorrer pelos produtores de vacina”.
Ainda conforme a nota, “como as vacinas são produzidas lote por lote, há sempre a possibilidade de acontecer problemas no processo produtivo específico de cada lote, o que gera a necessidade de reprogramação, por parte dos produtores, do cronograma de entrega dos quantitativos acordados com o Ministério da Saúde”.
Soros
A situação do abastecimento de soros é ainda mais preocupante. Presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia, o médico Érico Arruda diz que o Ceará, por exemplo, vem enfrentando uma queda na qualidade da assistência há dois meses em relação aos soros antitetânico e antirrábico.
“Chegamos a tal ponto que, em março, quando uma pessoa vinha ao hospital em Fortaleza após um acidente com cão ou gato, com indicação de profilaxia com soro antirrábico, nós anotávamos o telefone e o endereço dela para oferecer o produto quando ele estivesse disponível. Isso, muitas vezes, levava 10 dias”, afirma. “É preocupante porque a raiva humana, em quase todos os casos, vai evoluir para a morte”, completa.
No fim do março, segundo Arruda, o Ceará recebeu uma quantidade de soro suficiente para mais 20 dias. Soros são produtos de difícil obtenção, sem possibilidade de compra no mercado internacional. O Ministério da Saúde estima que os produtores voltem a entregar os soros em junho. Norte e Nordeste são áreas prioritárias.
Veja abaixo como está a situação dos imunobiológicos citados no informe do ministério e qual é a previsão de regularização.
1.Vacina dupla adulto (dT): contra difteria e tétano, do Instituto Butantan
O que diz o documento – Devido à necessidade de readequação do processo de aquisição, houve descumprimento do cronograma de entrega, comprometendo o estoque estratégico. Foi realizada uma compra emergencial no mercado internacional, mas a previsão de chegada é só para maio.
O que diz o laboratório – O Instituto Butantan informou que, para atender às normas legais vigentes das boas práticas de fabricação (BPF) exigidas pelas agências regulatórias, está reformulando todo o seu parque fabril, o que pode ter impacto nos processos produtivos.
A explicação do governo – Segundo nota enviada pelo Ministério da Saúde, o Instituto Butantan não entregou o quantitativo de vacina acordado e avisou sobre o problema em tempo muito curto. O secretário Jarbas Barbosa lembra que o Brasil tem dificuldades para adquirir vacinas no mercado internacional sem um prazo extenso por causa da elevada quantidade de doses de que o País necessita.
Segundo o ministério, no momento a demanda dos Estados é atendida parcialmente, com previsão de normalização apenas em maio. Para contornar o problema, o Ministério adquiriu a vacina por meio de um produtor internacional, e a remessa deve chegar no próximo mês. Enquanto isso, os Estados foram orientados a agendar a administração da vacina nos locais onde a dose não estiver disponível na sala de vacinação, com prioridade para mulheres grávidas.
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