Mundo pode sofrer escassez de material radioativo para medicina

Brasil tem projeto de reator que pode começar a funcionar em 2018

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Líderes na área de medicina nuclear preveem para 2016 uma grave crise mundial de abastecimento de uma matéria-prima radioativa utilizada em exames para detectar tumores e avaliar o funcionamento de órgãos como coração, cérebro, tireoide, rins, entre outros. Na semana passada, autoridades de todo o mundo se reuniram na França, convocados pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), para discutir estratégias de enfrentamento dessa crise.
 
O isótopo radioativo que pode minguar em um prazo de dois anos é o molibdênio-99. Ele dá origem ao tecnécio-99, substância utilizada em 80% dos exames diagnósticos na área de medicina nuclear. Nessa especialidade, a administração de materiais radioativos ao paciente permite a obtenção de imagens precisas de tecidos do corpo humano.
 
Para esse tipo de diagnóstico, o material radioativo é unido a moléculas que participam de reações fisiológicas no órgão a ser investigado. Quando essa união de materiais – chamada radiofármaco ou radiotraçador – é injetada no paciente, ela é atraída para o local de interesse e detectada pelas imagens obtidas nos exames. São as cintilografias.
 
“Praticamente todos os órgãos do corpo podem ser estudados com a medicina nuclear. Além da detecção de tumores, é possível detectar risco de infarto e diagnosticar a doença de Alzheimer, por exemplo”, explica o médico Celso Darío Ramos, presidente da Sociedade Brasileira de Medicina Nuclear (SBMN).
 
O tecnécio-99 é obtido por meio da fissão do urânio em reatores específicos, com potência energética muito menor do que a das usinas nucleares. Existem atualmente cinco grandes reatores responsáveis por fornecer 85% do molibdênio-99 utilizado em todo o mundo, que ficam no Canadá, França, Bélgica, África do Sul e Holanda. O Brasil não possui reatores capazes de produzir o isótopo.
 
Segundo o médico Cláudio Tinoco Mesquita, vice-presidente da SBMN, o mercado mundial de fornecimento de isótopos médicos é muito concentrado e frágil. Ele foi o representante da sociedade médica na reunião da OCDE, na França. “É frágil porque os reatores já têm décadas de uso e estão enfrentando problemas recorrentes. No próximo biênio, devem sair de operação os reatores do Canadá e França, o que pressionará o mercado”, diz Mesquita.
 
Uma crise semelhante já ocorreu em 2008, quando um dos reatores interrompeu suas atividades. O Brasil tem um projeto para se tornar autossuficiente na área. As discussões sobre a criação do Reator Multipropósito Brasileiro (RMB) começaram em 2008, mas ele não deve entrar em atividade antes de 2018 (leia mais abaixo).
 
A garantia de ter material suficiente para a realização dos exames nessa época dependerá, portanto, de acordos diplomáticos e comerciais firmados entre os países. “Esses acordos devem ser costurados com a maior celeridade possível, pois todos perceberam que momentos difíceis estão por chegar”, completa o especialista.
 
Reator Multipropósito Brasileiro
 
O projeto que pode tornar o Brasil autossuficiente em molibdênio-99 é o do Reator Multipropósito Brasileiro (RMB), em desenvolvimento pela Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), vinculada ao Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI). 
 
De acordo com o coordenador-técnico do projeto, José Augusto Perrotta, já foram pedidas as duas primeiras licenças para a construção do reator na cidade de Iperó, no interior de São Paulo: a licença ambiental, para o Ibama, e a licença de segurança, para a Diretoria de Proteção e Segurança da CNEN.
 
O complexo deve ser construído em um grande terreno cedido em parte pelo Centro Tecnológico da Marinha em São Paulo (1,2 milhões de metros quadrados, ou 120 hectares) e em parte pelo governo do Estado de São Paulo (800 mil metros quadrados, ou 80 hectares, que ainda devem ser desapropriados). 
 
De acordo com uma previsão feita em 2011, o custo total do projeto será de US$  500 milhões. Concluída a fase de licenciamento, segundo Perrotta, será feita uma avaliação mais refinada sobre os gastos reais da obra.
 
A ideia é que o RMB tenha capacidade de produzir o dobro da quantidade de molibdênio importada atualmente pelo Brasil. “Queremos atender e aumentar o fornecimento para consumo nacional e eventualmente podem ter sobras para exportação”, diz o coordenador.
 
Pesquisas
 
O complexo também vai ter vários laboratórios de pesquisas básicas ou para aplicação na indústria e na agricultura. “Vamos fazer um laboratório nacional de feixe de nêutrons, que é um acelerador de elétrons que produz um feixe de luz, que serve para analisar e caracterizar materiais em várias áreas do conhecimento”, diz Perrotta.
 
O objetivo é que pesquisadores de universidades e de indústrias de todo o país possam utilizar a infraestrutura. “O investimento de US$ 500 milhões não é muito levando em conta que é para o país inteiro. No futuro, ele vai atrair muitos pesquisadores que vão utilizá-lo”, diz. Segundo Perrotta,
 
O projeto teve aprovação do Ministério do Planejamento para receber R$ 400 milhões no Plano Plurianual (PPA) 2012-2015. “Porém isso não nos garante efetivamente o recurso. Estamos buscando a efetivação desse PPA para a fase seguinte do projeto, que é a do projeto detalhado”.

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