Tecnologia permite maior acompanhamento da fecundação e do desenvolvimento dos embriões, proporcionando melhorias na seleção dos que serão implantados. Novo equipamento contribui para o sucesso dos tratamentos de fertilização in vitro
Belo Horizonte – O primeiro ultrassom ninguém esquece, mesmo que o embrião seja do tamanho de um grão de arroz, quase imperceptível para os futuros papais e mamães. O coração, porém, reage de forma inesquecível.
Imagine, então, a emoção de assistir a um verdadeiro filme da vida: o momento exato em que o embrião começa a se dividir depois do encontro do óvulo com o espermatozoide. Para os médicos, isso chama-se clivagem. Para os pais, está ali o filho. Essa gravidez “cinematográfica” já é possível com o embrioscópio, que chega ao Brasil para aumentar o sucesso das fertilizações in vitro (FIV).
Segundo Bruno Scheffer, especialista e diretor do Instituto Brasileiro de Reprodução Assistida (Ibra), trata-se de um aparelho automático, colocado dentro da incubadora e programado para fazer imagens do embrião durante 24 horas. “É como se fosse uma filmadora, que permite coletar dados mais exatos da fecundação e do desenvolvimento do embrião, além de quantificar os momentos exatos da clivagem (divisão e formação) de cada um. Esse acompanhamento de perto do exato momento da fertilização e do desenvolvimento embrionário proporciona a melhora na seleção dos embriões e o aumento das taxas de sucesso nos tratamentos”, assegura.
Um estudo do Instituto Valenciano de Infertilidade (IVI), na Espanha, referência mundial no tratamento da reprodução humana, revelou que o sucesso da gravidez evolutiva (aquela com pouca chance de ser interrompida) aumenta para até 54%, contra 50% sem o uso da técnica. Segundo Scheffer, essa maior chance de engravidar é decorrente da melhora na seleção dos embriões que serão transferidos, possível pela avaliação da velocidade e das características da divisão embrionária, informações obtidas por meio das imagens. A análise auxilia o médico a escolher o embrião mais saudável e também a identificar o melhor dia para transferir o embrião.
Apesar de disponível há cerca de 10 anos, o embrioscópio só começou a ser adotado na Espanha nos últimos três, após aperfeiçoamento do aparelho e de trabalhos científicos sobre sua aplicabilidade clínica. “Sua utilização na medicina reprodutiva com resultados positivos é recente, mas não foi comprovado nenhum malefício do aparelho em relação aos gametas, embriões e bebês gerados pela técnica.” Para o especialista, a possibilidade de avaliar todo o processo de fecundação e desenvolvimento dará aos médicos melhores parâmetros de escolha do embrião a transferir.
Não é, contudo, um tratamento barato. A fertilização in vitro custa cerca de R$ 10 mil – embora o valor não seja alterado com a adoção do embrioscópio. A técnica é indicada para todos os casais que precisam da fertilização in vitro para engravidar, como aqueles com a qualidade de gametas femininos e/ou masculinos prejudicada, obstrução de tuba uterina, necessidade de doação de gametas, endometriose, síndrome do ovário policístico e mesmo problemas genéticos, nos quais é necessário selecionar geneticamente os melhores embriões.
A administradora S.M, 39 anos, primeira paciente do Ibra a recorrer ao embrioscópio, está grávida de um mês e meio. Depois de perder o primeiro filho, que nasceu prematuro, dois anos atrás, ela recebeu da ginecologista a indicação de recorrer à reprodução assistida, a partir dos exames que revelaram uma baixa contagem de hormônios. “Ela avaliou a minha pressa e vontade de ter filhos e me apresentou essa solução, para eu ter um acompanhamento mais de perto de todo o processo.” Já na primeira consulta veio a notícia, para ela surpreendente, de poder assistir ao desenvolvimento do embrião. “Nunca tinha ouvido falar nisso, mas adorei a oportunidade.”
Dois dias depois da coleta dos óvulos e dos espermatozoides, S.M. voltou à clínica para ver os embriões. “Foi maravilhoso. Vi os cinco óvulos fecundados, a multiplicação das células, o crescimento deles. Estavam ali os meus filhinhos, era o início de tudo.” Pela idade, ela podia implantar até três óvulos e congelar os demais, que estavam também em boas condições, e, após ser consultada pelo especialista, optou por isso.
Cinco dias depois, ocorreu a transferência. “É lindo e inexplicável. Vi o momento exato em que o líquido com os embriões foi colocado no meu útero. Naquele momento, soube que o meu bebê já estava dentro de mim.” Com a gravidez única confirmada na semana passada, agora ela pensa no futuro. “Daqui a um ano e meio, volto lá e implanto os outros.”
Fonte: Correio Braziliense