Os jogos olímpicos de Paris, além de nos entreter e extasiar com modalidades sendo disputadas a céu aberto em cartões-postais e monumentos históricos, nos deixam lições de persistência, planeamento, estratégia, determinação, disciplina, foco e trabalho em equipe. Atletas de alto rendimento, contudo, não são super-heróis, ainda que façam o que parece “impossível” para a maioria das pessoas. Isso ficou explícito nas Olimpíadas de Tóquio, em 2021, quando a norte-americana Simone Biles (dona de 11 medalhas olímpicas, sendo sete de ouro), abandonou as finais das competições de ginástica alegando problemas de saúde mental.
O fato chocou o mundo do esporte, trouxe o tema à tona, quebrou tabus e incentivou outros atletas de diferentes modalidades a pausarem suas carreiras por motivo semelhante. A tenista Naomi Osaka, vencedora do US Open em 2018, e o surfista (hoje medalhista olímpico), Gabriel Medina, são dois exemplos de atletas de alta performance que pararam de competir por um período para cuidar do bem-estar emocional e psicológico. Atento ao ocorrido em 2021, o Comitê Olímpico Brasileiro levou para Paris dez psicólogos e um psiquiatra para auxiliar os 277 atletas da delegação brasileira. Trata-se do maior time de profissionais especialistas em psicologia esportiva da história do país em competições internacionais.
Para entender como o tema está presente na nossa sociedade, antes da pandemia da Covid-19, a Organização Mundial da Saúde publicou, em 2017, um dossiê mostrando que 9,3% dos brasileiros sofriam com ansiedade, a maior proporção entre os países incluídos no levantamento. Cinco anos depois, em 2022, dados da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) mostram que a incidência de ansiedade entre crianças no SUS superou a dos adultos. Paralelamente, o Anuário Brasileiro de Segurança Pública traz o Brasil como o 8º país do mundo em número de suicídios, com um índice de oito mortes por grupo de 100 mil habitantes. Saúde mental é, portanto, um tema que precisa ser enfrentado com urgência pelas três esferas de governo.
Em âmbito municipal, a FEHOESP e o SindHosp elaboraram o Guia de Ações Municípios Saudáveis – Transformando Comunidades, Cuidando de Pessoas, material que está sendo disponibilizado para os candidatos a prefeito das 645 cidades paulistas. Nele, entre outras proposições, são apresentadas quatro agendas prioritárias para os futuros prefeitos e secretários municipais de Saúde: doenças crônicas, envelhecimento saudável, controle de epidemias e saúde mental. Para esta última agenda, a publicação defende a formação e capacitação das equipes da atenção básica para que adotem um olhar integral à saúde, incluindo os transtornos mentais, comportamentais e cognitivos, estratégias de prevenção, criação de políticas que suportem a saúde mental no trabalho e nas escolas, além de programas de intervenção precoce, especialmente para crianças e adolescentes.
Medalhistas olímpicos não chegam ao pódio sem antes superar limites e enfrentar dificuldades. Assim como os atletas, um ser humano saudável é aquele que se encontra em perfeita harmonia física, psicológica, espiritual e emocional. No dia em que conquistou o ouro olímpico por equipes em Paris, a ginasta Simone Biles começou o dia com terapia e, em entrevista coletiva logo após a competição, proferiu uma frase que é exemplo de superação e uma motivação para os que atravessam problema semelhante: “Neste momento, nada pode me quebrar”. Que possamos implementar políticas de saúde mental capazes de prevenir, promover e, depois de diagnosticado o problema, assistir e recuperar nossos cidadãos.
Francisco Balestrin
Presidente da FEHOESP e do SindHosp
Artigo publicado na edição de agosto/24 da revista LaborNews. Clique aqui e acesse a íntegra da publicação.