Com a proibição de reajuste a usuários com mais de 60 anos, operadoras antecipam aumentos aos mais jovens
A proibição de reajustar as mensalidades dos planos de saúde de beneficiários com mais de 60 anos, para contratos assinados a partir de janeiro de 2004, não aliviou a situação dos clientes conforme eles envelhecem. Na prática, os aumentos em decorrência da mudança de faixa etária, permitidos por lei, foram antecipados pelas operadoras e passaram a pesar mais, em geral, a partir dos 44 anos. Nessa idade, além do tradicional reajuste anual aplicado no mês de assinatura do contrato – que tem ficado acima de 10% nos acordos coletivos -, o cliente recebe uma dose cavalar de majoração de preço que pode chegar a 43,5%, conforme tabelas de planos coletivos por adesão de três grandes operadoras – Unimed, Amil e Sul América.
Ou seja, o valor do plano sobe duas vezes num mesmo ano, ficando em torno de 60% mais caro. Um ano antes de completar os 60 e estrear na terceira idade, o beneficiário ganha de presente de aniversário de 59 aumento de até 94,5%, além daquele anual. A situação não é mais fácil para as famílias com filhos aos 19 anos. Alguns convênios sobem entre 56,6% e 68,4% só por conta da idade.
As elevações dos preços por faixa etária variam conforme o plano e a operadora. São 10 faixas, de quatro em quatro anos, a partir dos 19 até os 59 anos, fixadas em norma da ANS que devem ser seguidas por todas as empresas. A variação de valor entre a menor e a última tem que ser de, no máximo, 500%. O novo preço é cobrado já no mês subsequente ao do aniversário do beneficiário.
Há convênio que distribui os percentuais entre todas as faixas de forma mais uniforme, como a Unimed. Com isso, os reajustes são sempre entre 16% e 35% em todas elas. Já a Sul América aplica aumentos menores de 24 a 39 anos – de 1,7% a 3,9%. Em compensação, em determinadas idades, a elevação é significativa – chega a 94,5% na última, de 59 anos.
“As faixas mais penalizadas são as acima de 40 anos”, reconhece a ouvidora da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), Stael Riani. A publicitária Ana Paula Ataíde Brito, 41, que o diga. Ela teve uma surpresa ao abrir a mensalidade do plano de saúde no ano passado, quando completou 40. “Já havia percebido pequenos aumentos relativos à faixa etária, mas dos 39 para os 40 anos foi um salto”, diz. O valor subiu 30%. “O reajuste foi pesado, a ponto de termos que cortar gastos”. Ela e o marido, Marcelio Gonçalves Pereira, ambos da mesma idade, pagam atualmente R$ 360 mensais cada pelos serviços da operadora Cassi, plano corporativo do Banco do Brasil.
Apesar de não concordar com os reajustes por faixa etária, Ana Paula já tinha se informado sobre eles, mas, mesmo assim, ficou surpresa com os valores cobrados. “Nunca enviaram uma carta, mas deixam essa informação bem nítida no site da operadora. Não escondem, mas não avisam diretamente também”, comenta.
Descontrole
Os consumidores de planos coletivos empresariais e por adesão sofrem ainda mais, porque o reajuste anual não é fixado pelo órgão regulador, como ocorre nos individuais, e sim livremente pelas operadoras. Com isso, os índices têm ficado bem acima da inflação anual, ultrapassando a casa dos 10%. Embora sofram a mesma pressão das elevações por faixa etária, os convênios individuais sobem menos, ainda que acima da inflação de 12 meses. Neste ano, o aumento fixado pela ANS foi de 7,93%.
Nos empresariais, o empregador, com maior poder de negociação, acaba segurando aumentos elevados, até custeando parte deles, para não pressionar o salário do empregado. Porém, nos contratos por adesão, aqueles firmados por trabalhadores com associações de classes e sindicatos, os reajustes são definidos pelas operadoras, sem obstáculos. O usuário tem como arma apenas a portabilidade de plano por outro menos pesado. Mesmo assim, tem que levar em consideração a cobertura e a rede referenciada para decidir por uma mudança devido ao valor.
Os reajustes por faixa etária devem estar discriminados no contrato assinado pelo beneficiário. Se ele não tiver uma cópia, deve solicitar outra ao seu convênio, para conferir os percentuais aplicados. “Pelo menos agora, os usuários têm a previsibilidade de quanto vão pagar ao longo do tempo. Antes, eles não sabiam. Era sempre uma surpresa”, afirma a ouvidora da ANS.
Antigos
Até a entrada em vigor do Estatuto do Idoso, em 2004, quando a ANS limitou os reajustes até a faixa de 59 anos, as majorações de preços eram de 10 em 10 anos, intensificando-se a partir justamente dos 60 até os 70 anos. Nesse intervalo de idade, as operadoras aplicavam correção de mais de 200% de uma só vez, justamente quando os clientes tinham o orçamento mais apertado por causa da aposentadoria.
A aposentada Arlene Mendes da Costa Cunha, 77, é a prova de que o plano de saúde pesa no bolso ao longo dos anos. Cliente da Golden Cross há cerca de 30 anos, ela paga hoje R$ 1.350 como dependente do marido. No total, a fatura da família, que inclui ainda a mãe de Arlene, de 99, chega a R$ 3.640. “Não me lembro de um ano em que não cobraram reajuste. E eles são cada vez maiores. Em todos esses anos de plano, nunca fui avisada de que cobrariam valor a mais em razão da idade, nem sabia que existia. E a maior parte das consultas é paga por fora do plano”, afirma.
Fonte: Correio Braziliense