Técnica usada apenas em pesquisas deixa de ser experimental no país
A estimulação magnética transcraniana vai deixar de ser um procedimento experimental no país para três indicações terapêuticas. É o que determina uma resolução do CFM (Conselho Federal de Medicina), cuja publicação está prevista para hoje no “Diário Oficial da União”.
A estimulação é indolor e não requer anestesia. A técnica usa uma bobina para gerar campos magnéticos que afetam os neurônios, ativando-os ou inibindo-os.
O tratamento com estímulos magnéticos era feito, até então, em alguns centros de pesquisa. Agora, ele poderá ser usado na prática médica em instituições que sigam parâmetros técnicos especificados na resolução.
A estimulação magnética só deixa de ser experimental se for superficial e em três casos: tratamento de depressões uni e bipolar (que pode causar oscilações de humor) e de alucinações auditivas em esquizofrenia e para planejamento de neurocirurgia.
“Essa técnica tem aplicação prática já em alguns países. No Brasil, a Anvisa [Agência Nacional de Vigilância Sanitária] autorizou a venda do equipamento, mas não existiam parâmetros para ter uma administração segura”, explica Emmanuel Fortes, 3º vice-presidente do CFM.
Nos EUA, a FDA (agência americana que regulamenta medicamentos) aprovou a estimulação em 2008.
Experiência nacional
A solicitação da aprovação foi feita pelo IPq (Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da USP), centro pioneiro em pesquisas com estimulação magnética no país.
O instituto estuda a aplicação da técnica contra depressão desde 1999, segundo Marco Marcolin, coordenador do Grupo de Estimulação Cerebral Não Invasiva do IPq.
“É um avanço das autoridades que regulam a atividade médica. Um produto importante passa a ser incorporado ao arsenal terapêutico”, diz Manoel Jacobsen Teixeira, diretor da Divisão de Neurocirurgia Funcional do IPq.
Teixeira diz que um aspecto relevante do método é o fato de ele não ser invasivo.
“Em relação ao eletrochoque, ele não precisa de anestesia geral nem de uma unidade hospitalar especializada. Isso reduz custos e riscos”, afirma. “É um método simples, barato, eficaz e extremamente preciso.”
Segundo a norma, só médicos poderão realizar o procedimento, que deverá ser feito em ambiente que ofereça condições para controlar possíveis complicações, entre elas as crises convulsivas.
Para evitar más práticas, o CFM orientou os conselhos regionais a inspecionar locais que oferecerem a técnica.
Estudos avaliam mais aplicações para a técnica
Apesar de o CFM (Conselho Federal de Medicina) ter aprovado a estimulação magnética transcraniana superficial apenas para três indicações terapêuticas, o leque de alvos de tratamento em pesquisa é muito maior.
Segundo o psiquiatra Marco Marcolin, já há evidências fortes de que o método funciona para tratar dor crônica e zumbido. “Também temos dados sólidos de que é eficaz para dependência de cocaína. Como o crack tem esquema semelhante, poderemos ter uma solução para um problema de saúde pública.”
Marcolin, que é coordenador do Grupo de Estimulação Cerebral Não Invasiva do IPq (Instituto de Psiquiatria da USP), diz ainda que o centro tem pesquisas que mostram melhora de perda de memória inicial para quem tem transtorno cognitivo leve. Há estudos iniciais em autismo.
O neurologista Manoel Jacobsen Teixeira afirma ainda que a estimulação é eficaz para o tratamento de pessoas com deficit neurológico após acidente ou derrame.
Pacientes com distonia e doença de Parkinson também podem se beneficiar da estimulação no córtex motor.
Já há também trabalhos no Brasil e no mundo para epilepsia, dislexia e transtorno de deficit de atenção.
Mas Teixeira pondera: “Não se pode simplesmente comprar o aparelho e aplicar, é preciso treinamento. Como todo método, há aplicações específicas e é preciso haver supervisão. Não se pode imaginar que essa seja a solução de todos os problemas.”
Fonte: Folha de S. Paulo