O crescimento do setor hospitalar brasileiro tem despertado cada vez mais o interesse de empresas de logística. De olho em atividades que não são – ou não deveriam ser – o foco das instituições de saúde, essas companhias têm ganhado espaço e investido de olho em novos contratos. O grande desafio, contudo, é superar os limites impostos pelos próprios hospitais, especialmente os privados, que ainda mostram resistência a terceirizar as operações logísticas.
As empresas especializadas estão crescendo com a oferta de serviços como armazenagem, gestão de compra e abastecimento de medicamentos e materiais, recebimento e fracionamento dos produtos. Muitas vezes, a atuação das companhias extrapola o campo médico e engloba atividades como limpeza, vigilância e manutenção de equipamentos.
Enquanto companhias que atendem o setor farmacêutico têm enxergado oportunidades no segmento, a Logimed já foi criada voltada à logística hospitalar. Pertencente ao grupo Andrade Gutierrez, a empresa surgiu em 2008 e começou com um contrato com a Santa Casa. Hoje, a Logimed atende 44 unidades de saúde, sendo dez hospitais. Sua estratégia é ganhar contratos por meio da oferta de redução dos gastos com logística.
É um processo ganha-ganha. Derrubamos em 20% a 25% o gasto com todo tipo de operação no fim do processo e reduzimos os estoques dos hospitais em cerca de 50%, afirma o presidente da empresa, Alexandre Dib.
A Logimed compra os insumos para os clientes e, com a escala, consegue negociar preços, além de fazer a armazenagem em seu centro de distribuição em São Paulo.
Existem vários distribuidores que vendem para hospitais. Queremos quebrar o paradigma. Estamos nos credenciando para quando o setor mudar, diz Dib. Vemos um mercado muito promissor. A área de saúde não tem organização e ainda é pulverizada.
Após os R$ 110 milhões de 2011, a Logimed espera faturar acima de R$ 160 milhões neste ano. Até 2014, a meta é chegar pelo menos a R$ 500 milhões, o que ainda é pouco expressivo para um grupo como Andrade Gutierrez, que fatura cerca de R$ 20 bilhões ao ano.
Enquanto o setor privado segue resistente para se abrir, o grupo vê oportunidades promissoras nas parcerias público-privadas (PPPs). Reconhecida pela atuação em construção pesada, a Andrade Gutierrez estuda participar de licitações para a construção de hospitais e unidades de saúde, o que abre portas para a divisão de logística. A Logimed estuda ainda atuar em outros nichos do setor, como cartões de benefícios de saúde, que concedem crédito ou benefício para compras em farmácias.
Na operadora logística de hospitais UniHealth, o setor público responde por 70% das operações. A empresa atua no Sudeste, Norte e Nordeste e atende laboratórios, hospitais e também a Cruz Vermelha. No exterior, tem contratos com o governo de Angola.
Esta é uma área que está mudando muito, porque metade do custo de um hospital se refere à compra de material e medicamento. Quando se aperta o orçamento e a instituição precisa reduzir custos, o primeiro lugar para isso está na logística bem feita, aponta a diretora de novos negócios da UniHealth, Mayuli Lurbe Fonseca.
A empresa foi criada em 2005 e, diferentemente da Logimed, faz toda gestão até o consumo do paciente, sem entrar na aquisição de bens. Com faturamento de R$ 40 milhões em 2011 e sem um grande grupo por trás, a operadora está tendo um ano mais fraco e por isso já pensa em alterar a estratégia. Todo mundo está estudando parcerias ou aquisições, já que ganha-se muito com escala no mercado. Decidimos que temos de fazer alguma coisa, comenta Mayuli.
Ela ressalta que, com as PPPs, o mercado de saúde está se consolidando em grandes consórcios e chama atenção para a dificuldade de entrar nos principais hospitais. O grande desafio é ter uma atuação maior no segmento privado. Criar parcerias e benefícios que consigam convencê-lo de que, apesar de ser uma área estratégica, é melhor ter uma parceria com operadoras logísticas, assinala.
Divisão do grupo Luft, a Bomi Brasil tem forte atuação junto a fabricantes da área de saúde e planeja expandir os negócios com hospitais, com foco no setor privado. A Bomi tem os fabricantes como clientes e os hospitais como destinatários. Nosso papel agora é integrar a cadeia, diz o diretor executivo da Bomi Brasil, Felipe Selistre.
O projeto é estabelecer contratos com hospitais a partir de 2013. Nenhum grande hospital terceirizou a logística interna, não há essa cultura, mas o mercado caminha para isso, afirma. O acesso da população aumentou e os hospitais precisam ser mais eficientes. Não é mais possível ocupar grande parte do espaço para armazenagem e essa não é uma área rentável.
A companhia tem cinco centros de distribuição nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste e deve expandir as operações em 2014. Criada há 15 anos, a Bomi tem hoje 150 clientes de diversos ramos ligados à saúde. A divisão representa aproximadamente 40% do faturamento total do grupo Luft, que supera R$ 1 bilhão.
Setor privado demonstra resistência
Apesar da resistência, o interesse de operadoras logísticas em expandir a atuação dentro de hospitais deve ganhar incentivo nos próximos anos. Ainda que as principais instituições sigam avessas à terceirização, a Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp), que representa os grandes nomes do setor, reconhece que a transformação é inevitável. O presidente, Francisco Balestrin, conta que, de olho nesse movimento, os hospitais membros estão contratando consultorias para desenvolver um sistema único de compra de materiais e medicamentos.
A mudança será muito positiva. Vai melhorar a prestação de serviços de saúde e vamos nos concentrar no que melhor sabemos fazer, diz Balestrin, que avalia que o processo de terceirização deve ocorrer no médio prazo, de três a quatro anos.
O presidente, contudo, chama atenção para a necessidade de padronização de materiais e critica o atual modelo de remuneração do setor. Antes, os hospitais estavam focados na prestação de serviços e, nos últimos anos, ficaram sob o controle das operadoras de planos de saúde, então se valeram principalmente dos reajustes de materiais e medicamentos, em meio ao represamento de reajuste de prestação de serviços. Com essa distorção, a área ficou extremamente nevrálgica para as instituições hospitalares, explica Balestrin, ressaltando que praticamente 50% das receitas de hospitais está vinculada à venda de materiais e medicamentos. Em 2011, os hospitais associados à Anahp tiveram faturamento de R$ 9,4 bilhões.
Fonte: Valor Econômico