Anvisa assume competência para regular terapias

O Brasil ainda não tem uma regulamentação específica sobre o desenvolvimento ou a comercialização de terapias celulares - apesar de já haver clínicas e laboratórios ...

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O Brasil ainda não tem uma regulamentação específica sobre o desenvolvimento ou a comercialização de terapias celulares – apesar de já haver clínicas e laboratórios vendendo serviços desse tipo no País.

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) publicou em março de 2011 uma resolução (RDC 9) com regras para o funcionamento de laboratórios – denominados Centros de Tecnologia Celular (CTCs) – que queiram produzir células humanas para uso terapêutico, incluindo células-tronco para uso em pesquisas clínicas. Porém, não há nenhum instrumento legal que determine o que pode ou não ser feito com essas células em seres humanos – deixando pesquisadores e empresas numa espécie de limbo regulatório e jurídico.

A Anvisa planeja publicar ainda neste mês uma portaria instituindo uma Câmara Técnica de Terapia Celular (CAT), que será incumbida de elaborar uma regulamentação adequada para o setor. O grupo será formado por cientistas da área e representantes dos Conselhos Federais de Medicina (CFM) e Odontologia (CFO), da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), do Ministério da Saúde e de associações de pacientes.

Segundo o gerente de Tecidos, Células e Órgãos da Anvisa, Daniel Freitas, a RDC 9 e o CAT são resultados de dois anos de pesquisa da agência sobre o assunto. A Anvisa é constantemente cobrada a fiscalizar denúncias de práticas e serviços supostamente irregulares com células-tronco, mas não havia clareza sobre sua autoridade para agir nesses casos. A Lei de Biossegurança, de 2005, já dava à agência competência para regular e fiscalizar a produção de células-tronco derivadas de embriões humanos, mas não necessariamente outros tipos de células.

Assim como qualquer pesquisa envolvendo seres humanos no Brasil, os ensaios clínicos com células-tronco já realizados ou em andamento no País têm de ser aprovados pela Conep, do ponto de vista ético, mas não há regulamentação nem fiscalização sobre a execução dessas pesquisas. Nem sobre a comercialização de eventuais terapias derivadas delas.

Como drogas. “Depois de muito debate, decidimos que temos, sim, competência para regulamentar sobre isso”, afirma Freitas. Segundo ele, chegou-se ao entendimento de que as terapias celulares devem ser regulamentadas como medicamentos, e não como procedimentos médicos – o que as coloca sob jurisdição da Anvisa, e não apenas da Conep ou dos conselhos de medicina.

Essa avaliação vai depender do grau de manipulação e do destino que será dado às células humanas, como ocorre nas regulamentações de outros países.

Casos em que as células são transplantadas para o mesmo tecido do qual foram colhidas, sem modificação do seu tipo celular original, poderão ficar isentos da nova regulamentação – como já ocorre com os transplantes de células-tronco de medula óssea, por exemplo, que têm uma regulamentação própria.

A preocupação maior é com os casos em que as células são modificadas do seu tipo original. Por exemplo, quando células-tronco embrionárias ou da medula óssea são induzidas a formar células cardíacas ou neurônios e transplantadas para tecidos diferentes do qual se originaram – que é o que se pretende fazer na maioria dos experimentos clínicos com células-tronco.

“Não há como saber se as células vão funcionar da mesma forma num tecido diferente, mesmo que sejam células do próprio paciente”, diz Freitas.

Alerta.
A única terapia celular comprovada e aprovada para uso em seres humanos é o transplante de medula óssea. Todas as outras aplicações de células-tronco são experimentais e só podem ser oferecidas gratuitamente, dentro de um projeto de pesquisa. Qualquer empresa, clínica ou hospital que cobre para fazer terapia com células-tronco deve ser denunciada à Anvisa.

Um dos primeiros assuntos que deverão ser discutidos pela Câmara Técnica de Terapia Celular (CAT) da Anvisa é o caso da empresa Excellion. Localizada em Petrópolis (RJ), ela vende serviços de multiplicação e estocagem de células humanas para fins terapêuticos e estéticos.

Um produto, chamado RevitaCell, utiliza células produtoras de colágeno da pele do próprio paciente (chamadas fibroblastos) para combater rugas e outras marcas estéticas do envelhecimento. Os fibroblastos são colhidos por uma biópsia, cultivados e multiplicados in vitro no laboratório da empresa, e acondicionados em seringas para aplicação. Além disso, a empresa fornece células-tronco extraídas de tecido adiposo (gordura) para uso em pesquisas clínicas nas áreas ortopédica e cardíaca.

Segundo a executiva chefe da Excellion, Lúcia Pimenta, a empresa tem todas as autorizações necessárias da Anvisa e da Conep para trabalhar. “Eu vendo um processo, não vendo células. As células são do paciente”, diz.

Segundo o especialista da Anvisa Daniel Freitas, porém, pode haver irregularidade na comercialização do RevitaCell. “O laboratório só pode entregar as células se o uso que se pretende dar a elas estiver aprovado”, diz.

A resolução RDC 9, de 2011, diz que “células humanas e seus derivados só poderão estar disponíveis para pesquisa clínica e/ou terapia pelos CTCs mediante a comprovação de aprovação da pesquisa clínica pelo sistema CEP/Conep ou comprovação de que o procedimento terapêutico é autorizado pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) ou Conselho Federal de Odontologia”.

Lúcia argumenta que uma tecnologia equivalente ao RevitaCell, chamada Laviv, já foi aprovada pela FDA nos Estados Unidos, e que a Excellion, com base no que diz a RDC 9, encaminhou um “dossiê” sobre a técnica para o CFM cinco meses atrás, mas não obteve resposta.

Segundo Freitas, mesmo que o CFM responda, o caso terá de ser avaliado pela CAT.

Fonte: O Estado de S. Paulo

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