Construir hospital não basta

Luiz Fernando Ferrari fala ao Correio Popular, de Campinas, sobre crise na saúde

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Sistema de Saúde de Campinas pede socorro
Publicado em 28/05/2017, Por José Eduardo Mansur – Correio Popular – Campinas – SP

O recente fechamento dos prontos-socorros infantil e adulto do Hospital de Clínicas da Unicamp (HC) acendeu o alerta para um diagnóstico: a falta de leitos em Campinas. Além da percepção da população de que faltam hospitais na cidade, públicos e privados, a gestão do setor sofre com a falta de investimentos. Seja por falta de repasses federais ou do financiamento particular, Campinas tem número de leitos abaixo do recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

O pronto-socorro adulto do HC chegou a suspender o atendimento nesta semana. Nos últimos dias, a unidade de emergência manteve uma média diária de 70 macas ocupadas, distribuídas pelos espaços disponíveis no hospital, inclusive os corredores. A capacidade oficial do setor é de 28 leitos. A superlotação atingiu também o Centro de Atenção Integral à Saúde da Mulher (Caism), que continua fechado para o atendimento a gestantes e recém-nascidos. Além da superação dos limites físicos e das equipes, o fechamento aconteceu ainda pela falta de equipamentos para atender à alta demanda.

Já o pronto-socorro infantil da Unicamp reabriu na última sexta-feira depois de permanecer uma semana impedido de receber novos pacientes. Foi preciso improvisar leitos na UTI e na enfermaria para prestar a assistência médica. “Você somente fecha um pronto-socorro para poder cuidar bem dos doentes que já estão ali”, diz Marcelo Conrado dos Reis, que atende no setor de pediatria da Unicamp e atuou como coordenador da unidade de urgência e emergência por 11 anos. É a terceira vez que a ala pediátrica suspende o atendimento desde 2015.

A existência de poucos hospitais de referência na região pode justificar a sobrecarga nas unidades da Unicamp, mais um sintoma de que faltam leitos, principalmente em Campinas. O pediatra do hospital alerta que o Estado de São Paulo já perdeu cerca de 1,1 mil leitos infantis desde 2010. A carência em relação às especialidades médicas é também confirmada pelo superintendente do HC. “Na minha opinião, há falta de leitos para casos mais graves, de maior complexidade – oncologia, neuro e trauma, por exemplo”, comenta o médico João Batista de Miranda.

Cálculo

Mas a percepção vira constatação ao se calcular o real número de leitos em Campinas, incluindo ainda as vagas disponíveis fora do Sistema Único de Saúde (SUS). Atualmente, a cidade possui 3.413 leitos nos hospitais públicos e privados, segundo levantamento atualizado do Ministério da Saúde. Em relação ao estudo demográfico, são 2,9 leitos para cada mil habitantes, marca acima da média nacional, que é 2,26 leitos. Mas, em comparação às cidades do País com o porte populacional semelhante, Campinas fica bem atrás de Porto Alegre (5,60), Goiânia (5,54), Belém (4,06) e Maceió (3,79). É preciso esclarecer que Campinas apresenta um caráter regional em relação às capitais usadas na comparação. Em contrapartida, a cidade se destaca pelo desenvolvimento econômico. Em Campinas, a relação entre o número de vagas nos hospitais e o contingente populacional também está abaixo do recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), que indica entre três e cinco leitos a cada mil habitantes como ideal. Ainda assim, o índice varia de acordo com as condições socioeconômicas de cada localidade ou país.

Para Murilo Almeida, provedor da Irmandade de Misericórdia de Campinas, que reúne a Santa Casa e o Hospital Irmãos Penteado, a situação na cidade é crítica, principalmente também por receber pacientes da região metropolitana. “Hoje, existe um grande déficit de leitos na rede pública do município. Dependendo do caso, se você não consegue as internações, pode haver perda de vidas”, lamenta o gestor.

A Secretaria de Saúde da cidade garante que as necessidades de urgência e emergência estão sendo atendidas. A Prefeitura está absorvendo a demanda provocada pelo crise de atendimento nas unidades da Unicamp. Ainda assim, o secretário de Saúde, Carmino Antônio de Souza, ressalta que há filas para as cirurgias eletivas, mas a situação deve ser normalizada até o fim do ano.

Construir hospital não basta

A saída não estaria somente na construção de novos hospitais, conforme Luiz Fernando Ferrari, diretor da Federação dos Hospitais, Clínicas e Laboratórios de São Paulo (FEHOESP). Para o administrador hospitalar, a deficiência na gestão é uma característica brasileira, com algumas exceções pontuais. “A gestão começa com um planejamento de oferta e demanda. Temos visto equipamentos inoperantes de um lado e fechamento de leitos de outro”, explica Ferrari, que sugere uma maior aproximação entre as esferas pública e privada. “Poderíamos usar a rede privada para atender os pacientes da rede pública, mas isso ainda é um longo caminho. É preciso avaliar ainda as necessidades de cada especialidade. Isso inclui a gestão de leitos de longa permanência e de emergência, por exemplo, o que poderia desafogar alguns setores”, esclarece Ferrari.

Ainda de acordo com o representante da FEHOESP, a atual crise econômica tem provocado o fechamento de leitos na rede privada. “É a maneira que o gestor encontra para cortar custos”, resume Ferrari.
No total, a rede privada de Campinas conta 25 hospitais. Na esfera pública, a cidade tem 61 unidades básicas de saúde, 18 centros de atendimento especializado e seis polos de urgência e emergência.

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